quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

GOLPE DE ESTADO MILITAR EM WASHINGTON



"Tenho pendurada na parece a primeira página do ‘Daily Express’ de 5 de setembro de 1945 com as seguintes palavras: “Escrevo isto como uma advertência ao mundo”. Assim começava uma reportagem de Wilfred Burchet sobre Hiroshima. Foi a notícia bomba do século.

Por John Pilger, no jornal inglês “The Guardian”

Por causa da solitária e perigosa viagem com que desafiou as autoridades de ocupação estadunidenses, Burchet foi colocado na berlinda, sobretudo por parte de seus colegas. Avisou que um ato premeditado de assassinato em massa em uma escala épica acabava de dar o tiro de saída para uma nova era de terror.

Na atualidade, (a advertência de) Wilfred Burchett está sendo reivindicada por fatos quase diários. A criminalidade intrínseca da bomba atômica está sendo corroborada pelos Arquivos Nacionais dos EUA e pelas ulteriores décadas de militarismo camuflado como “democracia”. O psicodrama sírio é um exemplo disso. Uma vez mais, somos reféns da perspectiva de um terrorismo cuja natureza e história continuam sendo negadas, inclusive pelos críticos mais liberais.

A grande verdade inominável é que o inimigo mais perigoso da humanidade está do outro lado do Atlântico.

A farsa de John Kerry e as piruetas de Barack Obama são temporais. O acordo de paz russo sobre armas químicas será tratado ao longo do tempo com o desprezo que todos os militaristas reservam para a diplomacia. Com al-Qaida figurando agora entre seus aliados e com os golpistas armados pelos EUA solidamente instalados em El Cairo, os EUA pretendem esmagar os últimos estados independentes do Oriente Próximo: primeiro a Síria, logo o Irã. “Esta operação (na Síria)" disse o ex-ministro de exterior francês Roland Dumas em junho, “vem de muito tempo atrás. Foi preparada, pré concebida e planejada”.




Quando o público está “psicologicamente marcado”, como descreveu o repórter do “Canal 4” [inglês] Jonathan Rugman, a abrangente oposição do povo britânico a um ataque contra Síria, a supressão da verdade se converte em tarefa urgente. Seja ou não certo que Bashar al Assad ou os “rebeldes” utilizaram gás nos subúrbios de Damasco, são os EUA, e não Síria, o país do mundo que utiliza essas terríveis armas de forma mais prolífera.

Em 1970, o Senado informou: “Os Estados Unidos derramaram no Vietnam uma quantidade de substâncias químicas tóxicas (dioxinas) equivalente a 2,7 quilos por cabeça”. Aquela foi a denominada “Operação Hades”, mais tarde batizada mais amavelmente como “Operação Ranch Hands” , origem do que os médicos vietnamitas denominam “ciclo de catástrofe fetal”. Ocorreram gerações inteiras de crianças afetadas por deformações genéticas e monstruosas. John Ketty, cujo militarismo corre nas veias, seguramente recordará.



Também se viu isso no Iraque, onde os EUA utilizaram urânio empobrecido e fósforo branco, tal como fizeram os israelenses em Gaza. Para eles, não houve as “linhas vermelhas” de Obama, nem tampouco psicodrama de enfrentamento.



O repetitivo e estéril debate sobre se “nós” devemos “adotar medidas” contra ditadores selecionados (isto é, se devemos aplaudir aos EUA e seus acólitos em outras novas matanças aéreas) faz parte de nossa lavagem cerebral. Richard Falk, professor emérito de Direito Internacional e relator especial da ONU sobre Palestina, descreve isso como “um disfarce legal/moral unidirecional com pretensões de superioridade moral e cheia de imagens positivas sobre os valores ocidentais e imagens de inocência ameaçada cujo fim é legitimar uma campanha de violência política sem restrições”. Isso “está tão amplamente aceito que é praticamente impossível questionar”.

Trata-se da maior mentira, parida por “realistas liberais” da política anglo-estadunidense e por acadêmicos e mídia que se autoelegeram gestores da crise mundial, mas [também] como causadores dela. Eliminando o fator humanidade do estudo dos países e congelando seu discurso com um palavreado a serviço dos desígnios das potências ocidentais, endossam a etiqueta de “falido”, “delinquente” ou “malvado” aos Estados que logo sofreram sua “intervenção humanitária”.

Um ataque contra Síria ou Irã ou contra qualquer outro demônio estadunidense se fundará em uma variante de moda, a “responsabilidade de proteger”, o R2P, cujo fanático porta-voz é o ex-ministro de Relaciones Exteriores australiano Gareth Evans, co-presidente de um “centro mundial” com base em Nova York. Evans e seus grupos de pressão generosamente financiados jogam um papel propagandístico vital instando à “comunidade internacional” a atacar países sobre os que “o Conselho de Segurança da ONU rechaça aprovar alguma proposta, ou que recusa abordá-la num prazo razoável”.

Os Evans vêm de longe. O personagem já apareceu em meu filme de 1994, “Death of a Nation”, que revelou a magnitude do genocídio em Timor Oriental. O risonho homem de Camberra eleva sua taça de champanhe para brindar por seu homólogo indonésio enquanto sobrevoam Timor Oriental em um avião australiano depois de ter firmado um tratado para piratear o petróleo e gás do devastado país em que o tirano Suharto assassinou ou matou de fome a um terço da população.

OBAMA-FRAUD

Durante o mandato do “débil” Obama, o militarismo cresceu talvez como nunca antes. Ainda que não haja um só tanque no gramado da Casa Branca, em Washington ocorreu um golpe de Estado militar.

Em 2008, enquanto seus devotos liberais enxugavam suas lágrimas, Obama aceitou, em sua totalidade, o Pentágono que herdou de seu predecessor George Bush, completo com todas suas guerras e crimes de guerra. Enquanto a Constituição vai sendo substituída por um incipiente Estado policial, os mesmos que destruíram o Iraque com base na comoção e pavor, que converteram o Afeganistão em uma pilha de escombros e que reduziram a Líbia a um pesadelo hobbesiano, esses mesmos são os que estão ascendendo na administração estadunidense. Por traz de sua fachada amedalhada, são mais numerosos os antigos soldados estadunidense que estão se suicidando do que os que morrem nos campos de batalha. No ano passado, 6.500 veteranos se mataram. Vamos colocar mais bandeira.

O historiador Norman Pollack chama isso de “liberal-fascismo”: “No lugar de soldados marchando a passo de ganso, temos a aparentemente mais inofensiva militarização total da cultura. E no lugar do líder grandiloquente, temos um reformista falido que trabalha alegremente na planificação e execução de assassinatos sem deixar de sorrir um só instante”. Todas as terças-feiras, o “humanitário” Obama supervisiona, pessoalmente, uma rede terrorista mundial de aviões não tripulados que reduz a mingau as pessoas, a seus resgatadores e a seus doentes. Nas “zonas de conforto” do Ocidente, o primeiro líder negro no país da escravidão ainda se sente bem, como se sua mera existência supusera um avanço social, independentemente do rastro de sangue que está deixando. Essa obediência a um símbolo destruiu praticamente o movimento estadunidense contra a guerra. Essa é a façanha particular de Obama.



Na Grã Bretanha, as distrações derivadas da falsificação da imagem e a identidade políticas não triunfou completamente. A agitação já começou, mas as pessoas de consciência deveriam dar-se pressa. Os juízes de Nuremberg foram sucintos: “Os cidadãos particulares têm obrigação de violar as leis nacionais para impedir que se perpetrem crimes contra a paz e a humanidade”. A gente normal da Síria, e muitas outras gente mais, bem como nossa própria autoestima, não se merecem menos nestes momentos.”

FONTE: escrito por John Pilger, no jornal inglês “The Guardian” (tradução: “Diálogos do Sul”). Transcrito no portal “Vermelho”   (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=232355&id_secao=9). [Título modificado e imagens do Google adicionados por este blog ‘democracia&política’].

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