sábado, 24 de outubro de 2009

LE MONDE: BRASIL CONSTRÓI HIDRELÉTRICA ECOLOGICAMENTE AVANÇADA

"Brasil constrói uma barragem ecologicamente neutra

Entre colinas e campos, é um imenso canteiro de obra hidrelétrica como qualquer outro, com sua barragem, seus túneis e seus diques de terra ocre ao longo do rio São Marcos, a três horas de carro de Brasília. Mas a construção da central Batalha, que deverá ser inaugurada em 2011, dá lugar a um projeto ambiental inédito nessa escala. Este será apresentado pelo Brasil durante o Congresso Mundial das Grandes Barragens - Hydro 2009 -, que ocorrerá de 26 a 28 de outubro em Lyon, França.

Trata-se de ser ecologicamente neutro, reconstituindo tão fielmente quanto possível a paisagem natural que ali existia, em sua diversidade e sua originalidade, antes do início da obra.

Esse programa é conduzido em parceria por duas empreiteiras de usinas, gigantes do equipamento brasileiro: Camargo Corrêa, uma das líderes da construção civil sul-americana, com 30 mil empregados; e Furnas, que construiu e administra 13 centrais elétricas que produzem 10% da energia do país.

A compensação ambiental é implementada por essa dupla em Cristalina, no estado de Goiás, e em dois outros canteiros, o primeiro muito perto daqui e o segundo no sul do Brasil. A construção das três usinas deverá "consumir", preveem os especialistas, 36 milhões de litros de diesel, que exigem em troca o plantio de cerca de 68 mil arbustos, a metade dos quais já está na terra. No ritmo em que se realiza a fotossíntese, explica o engenheiro Eduardo Peixoto, a operação de compensação será integral ao fim de 20 anos.

O cenário é preciso. Ele começa antes das obras, com a coleta do germoplasma, o material genético de várias espécies vegetais, sobretudo orquídeas e bromélias, vitais para a proteção da fauna. As primeiras retêm água e são um meio ideal para os pequenos vertebrados, os répteis e os anfíbios; as segundas são um lugar de nidificação e alimentação para diversas famílias de pequenos animais.

Essas sementes e muitas outras, representativas da diversidade genética do ecossistema, crescem depois em sacos de terra entrepostos em estufas. A de Batalha abriga 100 mil plantas, representando 40 espécies, que são repicadas nas terras degradadas pela obra e previamente restauradas. A reabilitação dos espaços muito degradados pela construção nos arredores da futura usina recorre a diversas técnicas. Por exemplo, recuperam-se grandes volumes de terra misturada aos arbustos dos campos na área que será inundada pelo lago de retenção da barragem; recuperam-se depois, enriquecidos ou não de adubos, os solos empobrecidos ou prejudicados pela obra.

Assim, é possível semear herbáceas de rápido crescimento que protegem da erosão, reconstituir "galerias" de arbustos ou mesmo instalar poleiros artificiais que atrairão os pássaros e os morcegos. Outra técnica consiste em compor "ilhotas de grande diversidade", reunindo cinco plantas de espécies diferentes que, crescendo juntas, garantirão uma pluralidade ecológica. Todos esses procedimentos têm baixo custo e respeitam o meio ambiente.

Esse programa adquire um valor exemplar aos olhos dos brasileiros. Diretor da construção em Furnas, Marcio Porto salienta que ao apresentá-lo em Lyon seu país "quer mostrar ao mundo que as empresas brasileiras têm grandes preocupações ambientais e desenvolvem projetos inovadores para reduzir as emissões de gases do efeito estufa".

Com cerca de 25% das espécies catalogadas no mundo, o Brasil possui a maior biodiversidade do planeta. Com exceção da Amazônia, no entanto, suas biomassas estão fortemente degradadas. É o caso da mata atlântica, a floresta primária atlântica, e do cerrado, a savana central. Os dois figuram na lista mundial dos 25 "hotspots" - regiões prioritárias - da biodiversidade, ao mesmo tempo muito ricas biologicamente e muito ameaçadas.

Diretor de projetos na Camargo Corrêa, Marco Bucco insiste na urgência de uma "conscientização ambiental" da população, para a qual as duas empresas envolvidas contribuem criando nas obras "centros integrados de educação", que já foram frequentados por mais de 6 mil pessoas, na maioria muito jovens.

Essa "mudança de cultura" passa pela escola. Perto de Cristalina, uma antiga fazenda se tornou "reserva do patrimônio natural". Os alunos dos arredores vêm aqui aprender os rudimentos da ecologia. E, quando se pede a uma classe de cerca de 30 crianças para explicar o processo da fotossíntese, todas as mãos se levantam, para grande prazer de seu professor."

FONTE: reportagem de Jean-Pierre Langellier publicada hoje (24/10) no jornal francês Le Monde e reproduzida no portal UOL. Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves.

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