sábado, 14 de junho de 2008

VARIG: ENTREVISTA COM O EX-PRESIDENTE DA ANAC

O blog do Nassif publicou hoje uma esclarecedora entrevista de Eliane Catanhede, da Folha de São Pulo, com Milton Zuanazzi, ex-presidente da Agência Nacional de Aviação Civil-ANAC, sobre o problema de salvação da VARIG, que tanta crítica gerou na oposição e na mídia. Transcrevo:

"A ENTREVISTA DE ZUANAZZI

FOLHA - O governo chegou a lavar as mãos para a falência da Varig e depois agiu para salvá-la. Por quê?

MILTON ZUANAZZI - A Varig ingressou na recuperação judicial em 2005, mas o plano de salvamento só ocorreu em fevereiro de 2006. O plano foi de fevereiro, a Anac foi criada em março. Até então, não tinha nenhuma decisão, nem do juiz Luiz Roberto Ayoub de que não haveria sucessão fiscal e trabalhista.
Quem compraria uma empresa com uma dívida que se calculava acima de R$ 7 bilhões e um patrimônio que não chegava a R$ 2 bilhões? Quem? O primeiro ato do dr. Ayoub, tentando viabilizar a não-sucessão foi em 25 de abril. Mesmo assim, houve uma divergência imensa. Mas pergunta era: quer-se ou não salvar a Varig? Ora, com a não-sucessão das dívidas, o juiz abriu ali o caminho.

FOLHA - Para aventureiros?

ZUANAZZI - Não era para aventureiros. Porém, na maioria das empresas, o medo não havia sido vencido, porque um juiz de primeira instância tinha tomado a decisão. Um advogado não é obrigado a achar que a decisão é um trânsito em julgado.

FOLHA - Muito menos um empresário pragmático e sério.

ZUANAZZI - Claro, ele tem receio porque, se tem sucessão e ele acha que não tem, ele leva um rombo que pode até quebrar a empresa dele.

FOLHA - Então, o sr. concorda que quem aceita é aventureiro?

ZUANAZZI - Negativo.

FOLHA - Quem paga as dívidas trabalhistas e fiscais?

ZUANAZZI - E se ela falisse, quem pagaria? Ninguém.

FOLHA - E os ofícios da Denise pedindo explicações sobre os três sócios brasileiros da Volo?

ZUANAZZI - As exigências que fizemos na troca de ações da VarigLog o antigo DAC [antecessor da Anac] jamais fez, e elas foram feitas pela relatora, a dra. Denise, que fez por sua conta, foi impetuosa. Mesmo assim, levei à diretoria para consolidar uma posição, que é o que ela deveria ter feito e não fez. A VarigLog entrou na Justiça contra nós, justamente porque aumentamos os rigores.

FOLHA - A Denise diz que nunca responderam os ofícios à Volo do Brasil pedindo explicações sobre o capital dos sócios. Por quê?

ZUANAZZI - Foi tudo visto. Essa é uma versão totalmente errada que está na mídia. Basta olhar o parecer da SSA [Superintendência de Serviços Aéreos da Anac].

FOLHA - Eu tenho um resumo do parecer aqui, e ele diz que o equivalente a 94% do capital da Volo do Brasil na verdade é da Volo LCC, do Matlin Patterson.

ZUANAZZI - Não, não. Você faz um enxerto (sic). Leia mais adiante, onde diz que, portanto, é necessário um contrato de mútuo, ou seja, o dinheiro estrangeiro só pode entrar por empréstimo. O único senão da SSA era o IR pessoa física de um sócio, que se negava a apresentar, alegando sigilo fiscal. Daí nós chamamos a Procuradoria Geral da Anac.

FOLHA - Como o procurador fez o parecer em menos de 24 horas?

ZUANAZZI - Qual o problema, se você sabe que a Varig vai falir? Por que você vai deixar uma empresa nacional falir, se o juiz está te dizendo que ela não tem mais capacidade operacional e se está nos autos a perspectiva de novo leilão?

FOLHA - Olhando olho no olho, o sr. acreditava e acredita que os três sócios brasileiros tinham mesmo capital nacional para uma empreitada daquelas? E que o leilão foi formatado para eles?

ZUANAZZI - O contrato de mútuo, com empréstimo, deu esse capital para eles.

FOLHA - Quem estava comprando a VarigLog para comprar a Varig, eram eles ou o Matlin Patterson?

ZUANAZZI - Eles estão discutindo isso na Justiça de São Paulo, porque agora eles brigaram. Pela Anac, o capital era estrangeiro, mas com contrato de mútuo. Está no processo.

FOLHA - Eles tinham cacife para pagar esse empréstimo?

ZUANAZZI - Iriam pagar com a operação da VarigLog.

FOLHA - Se desse certo... Senão, o Matlin Patterson é um fundo bobo que poderia entrar pelo cano?

ZUANAZZI - Isso é problema deles. O que nós tínhamos que garantir é que o capital estava nacionalizado, e isso nós garantimos -80% estava nacionalizado. Apesar de essa lei [Código Brasileiro de Aeronáutica, que limita o capital estrangeiro em 20% do setor] ser uma lei ultrapassada, até pela própria Constituição, nós seguimos à risca.

FOLHA - Se é tão fácil, por que não houve resposta ao ofício da Denise?

ZUANAZZI - Porque eles entraram na Justiça, eles, a Volo do Brasil, o escritório do dr. Roberto Teixeira. Nossa relação com o dr. Teixeira foi inteiramente de litígio. Como podemos ser influenciados por alguém com quem litigamos?

FOLHA - Com quem o sr. falava ao telefone durante a reunião decisiva da Anac na Defesa, em 23 de junho?

ZUANAZZI - Não falei naquele dia com a Dilma. Nem antes nem depois. Falei uma vez com a Erenice. Qual o problema? A Anac decidiu soberanamente. A Denise diz que escutou uma voz de mulher, mas ela só poderia escutar se estivesse no viva voz, e não estava. É sem sentido. E se fosse a minha mulher? Não dá para trabalhar com a ilação da ilação da ilação.

FOLHA - Com quem o sr. acertou a reunião decisiva da Anac na Defesa?

ZUANAZZI - Conversei com o dr. Ayoub na segunda, dia 19 (de junho de 2006), e ele disse que a Varig tinha fôlego para voar até sexta-feira ou sábado, não mais que isso. Era o prazo fatal. No dia 21, ele comunicou que surgiu a perspectiva de um novo leilão. Avisei o governo.

FOLHA - A Denise, publicamente, insinua que o sr. foi o pivô de uma operação para manipular a lei para tentar salvar a Varig.

ZUANAZZI - Eu desconfio muito daqueles que se utilizam da procrastinação jurídica constantemente, porque, às vezes, procrastinar tem outros interesses. Ali se tratava do seguinte: ou aprovávamos naquela sexta-feira, ou a Varig morria.

FOLHA - Há insinuações de que Denise seria lobista da TAM.

ZUANAZZI - Eu não faço essa acusação. A Denise nunca negou, e eu respeito, que ela era a favor da falência da Varig. Achava que a empresa não tinha mais como sobreviver.

FOLHA - Por algum interesse?

ZUANAZZI - Não posso negar nem afirmar."

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