sábado, 23 de fevereiro de 2008

O BRASIL E O “INVESTMENT GRADE”

O Blog do jornalista Luis Carlos Azenha, “viomundo”, postou hoje o artigo muito bom de título “GRAU DE INVESTIMENTO: QUEM DÁ NOTA PARA AS EMPRESAS QUE NOS DÃO NOTA?”
Transcrevo:

“SÃO PAULO - Ah, mas para o Brasil obter "grau de investimento" ainda falta... Você já ouviu isso no Bom Dia Brasil ou na CBN? É um mantra repetido sem contexto e sem explicação, como se moedas de ouro fossem chover do céu quando três empresas americanas decidirem que não é arriscado investir no Brasil.
Essas empresas - a Standard & Poor's, a Moody's e a Fitch - são uma espécie de SERASA de Wall Street. São agências de classificação. Avaliam empresas e países. E ganham fortunas com seus relatórios. Pergunto: quem é que dá nota para as empresas que dão nota?
Hoje a Standard dá BB+ ao Brasil, com viés de alta. A Moody's dá Ba1, estável. E a Fitch dá BB estável.
Isso significa: "Risco aceitável. Segurança financeira questionável, grandes incertezas, exposição a condições políticas e econômicas adversas, levando à capacidade inadequada de cumprir compromissos financeiros".
Para obter o chamado "grau de investimento" o Brasil precisa voltar da escola com um BBB na cadernetinha.
É óbvio que milhares de empresários de todo o mundo não estão nem aí para a nota. Continuam investindo no Brasil, independentemente do que dizem as três professorinhas de Wall Street.
Vou contar um segredinho a vocês: elas não estão com essa bola toda.
Existem críticas de cunho político. Sugerem, por exemplo, que as agências de classificação de crédito assumiram o papel do Fundo Monetário Internacional sem o poder deste. Quem não seguir as fórmulas ortodoxas de Wall Street dança.
Mas também há outras críticas. Sobre tráfico de influência e incompetência pura e simples.
De acordo com o New York Times, dias antes de quebrar a empresa americana Enron estava na mira de outra companhia, a Dynegy. "Executivos das grandes empresas de investimento que poderiam lucrar com o negócio pressionaram a Moody's para manter o grau de investimento da Enron, ainda que as ações da empresa tivessem caído a níveis que indicavam que a dívida dela era altamente arriscada", escreveu o jornal.
Poucos dias antes de falir a Enron era um investimento altamente recomendado pelas agências. De uma hora para a outra, a Moody's derrubou a classificação da Enron em 5 níveis, a Standard & Poor's em 6 e a Fitch em 10. Ou seja, foram "pegas de surpresa" pelo colapso da companhia. Ué, então qual é o sentido de seguir as recomendações?
Um caso mais recente envolve o Credit Suisse. Em 12 de dezembro de 2000 o banco ofereceu papéis no mercado garantindo retorno anual de até 10%. As três agências de classificação deram aos papéis a nota máxima, AAA ou Aaa. No final de 2006 as perdas com o papelório do Credit Suisse já tinha atingido cerca de U$ 125 milhões.
Ou seja, quem se baseou nas notas das três empresas de Nova York, que juntas controlam 95% do mercado mundial de classificação, se deu muito mal.
Os investidores deveriam ter levado a sério a nota que acompanha os relatórios da S&P, por exemplo: "Any user of the information contained herein should not rely on any credit rating or other opinion contained herein in making any investment decision." Ou seja, qualquer usuário da informação contida aqui não deve se basear nela ou na classificação de crédito ou em qualquer opinião contida aqui ao tomar uma decisão de investimento."
Pergunto: se nem eles mesmos se levam a sério, você deveria levá-los?”

COMENTÀRIO DESTE BLOG “DEMOCRACIAPOLITICA”.

Esse muito bom artigo do conceituado jornalista Luis Carlos Azenha traz-me a satisfação de constatar que penso de maneira semelhante. Em outro contexto, já expressei conceitos análogos. Em 16 de janeiro último, neste blog “democraciapolitica.blogspot.com”, postei um artigo intitulado "BRASIL É O 101º EM LIBERDADE ECONÔMICA" - RUIM?

A motivação daquele meu texto foi a seguinte. O editorial do jornal Folha de São Paulo de 16/01/08 fez-me refletir sobre os interesses que movem o mundo e como nos tentam impingir maneiras de pensar e de agir convenientes para as grandes potências industrializadas.

O citado editorial da Folha tratou dos artigos do "The Wall Street Journal" e da "Heritage Foundation", dos EUA, que classificaram em péssima posição o Brasil e, ainda pior, a China, a Índia e outros países (Argentina, Venezuela) que, “incoerentemente”, ostentam elevadas taxas de crescimento.

Transcrevo trechos do referido editorial da Folha, de título "Brasil é 101º em liberdade econômica”:

"Segundo o estudo, o Brasil, apesar de ser uma potência regional, não é forte em nenhum dos dez itens que compõem o levantamento -como liberdade fiscal, tamanho do governo e liberdade de investimento. Ele critica ainda a carga tributária cobrada de empresas e pessoas físicas, que classifica como "opressiva". "Brasil sofre com uma frágil liberdade financeira e um grande governo central. A inflexibilidade regulatória faz com que a abertura de um negócio leve mais tempo do que a média mundial. Existem em várias áreas restrições significativas sobre o capital estrangeiro e o governo continua fortemente envolvido em bancos e finanças”.
“A China foi a 126ª colocada, e a Índia, a 115ª colocada."

ANÁLISE DA REFERIDA NOTÍCIA DOS JORNAIS NORTE-AMERICANOS E DA FOLHA

Esses países estão ruins para quem?

A reflexão a fazer é: Qual o interesse dos EUA em considerar ruim essa situação na China, na Índia, no Brasil e em outros países que estão prósperos? Comemoraríamos em alcançar ótimas posições no ranking elaborado sob a ótica norte-americana?

Para essa análise, é conveniente olharmos o passado recente, quando o Brasil e a América Latina em geral foram assolados com imposições de conceitos "modernos" de Estado e Nação, por interesse egoísta dos países desenvolvidos. O resultado para os países que seguiram aquelas imposições foi trágico. Para os países ricos e industrializados foi muito bom termos obedecido.
As diretrizes nos chegavam por meio do FMI, de agências de classificação de risco, de grandes corporações financeiras, de encontro de mandatários etc.

Nos anos 90, e desde então, foram massificadas pela nossa mídia, porta-voz brilhante e dedicada daqueles interesses externos, e pelo governo PSDB/PFL/FHC, concepções julgadas muito mais "modernas" para o Brasil. Diretrizes "novas" que nos levariam para o primeiro mundo.

Exemplos: 1) economia totalmente aberta, com livre circulação de capitais financeiros, serviços e mercadorias, sem barreiras tarifárias; 2) total desregulamentação do mercado financeiro; 3) regulamentação econômica tipo laissez faire; 4) Estado-mínimo, não-regulador da atividade econômica, não-promotor do desenvolvimento, voltado apenas para o social ; 5) Estado-enxuto (que a globalização fez substituir o obsoleto Estado-Nação), onde o planejamento estratégico e o comando da economia também são funções do mercado e devem passar para os investidores privados ; 6) reforma administrativa do Estado para adequá-lo à Nova Ordem Mundial; e muitos outros "avançados" conceitos nos eram martelados e ainda são.

Aquela propaganda com óbvios interesses externos capciosos insistia muito na necessidade da nossa urgente e total abertura aos capitais, produtos e serviços estrangeiros.

Isso continua. Já comentamos neste blog, ontem (22/02/2008), a ferrenha defesa da mídia em prol da entrada de capitais privados estrangeiros na exploração dos megacampos de petróleo e gás descobertos pela PETROBRÁS. Quem for contra à exploração por estrangeiros, segundo editorial da Folha de São Paulo, é “dinossauro estatizante”.

O tal de neoliberalismo aqui endeusado na década de 90 trouxe, para os países da "periferia", além da 1) desindustrialização e de outros danos à economia, muitas conseqüências ruins. Acarretou ainda: 2) a eliminação, com o "Estado enxuto", de programas estatais de bem-estar social; 3) a exclusão econômica de grande parte da população e o seu ingresso na faixa de extrema pobreza ; 4) o grande desemprego (e as suas variantes de subemprego e trabalho informal); 5) a fome; 6) o agravamento da desigualdade na distribuição da renda e os conseqüentes grandes aumentos da criminalidade e das perturbações sociais nas cidades e nos campos ; e muitas outras mazelas.

Segundo estudo da ONU divulgado há poucos anos, 44% da população latino-americana já mergulhara abaixo da linha de pobreza ao final da década de 90. No início, em 1990, nela havia 190 milhões de miseráveis. No final da década, havia o dobro.

Saíram-se melhor daquela torrente de doutrinações os países que não obedeceram totalmente ao G-7, ao FMI, ao BIRD, ao BID e que enfatizaram o seu desenvolvimento tecnológico e o amparo à indústria nacional. Esse foi o caso das chamadas economias mistas, a China, a Índia, a Coréia do Sul. Também, a década foi melhor para aqueles que colocaram, pelo menos, alguma taxa ou controle seletivo sobre o movimento dos capitais pelas fronteiras, como o Chile e a Malásia.

Essas reflexões dão maior compreensão sobre o que está por trás da notícia acima transcrita, sobre os EUA darem notas ruins para a China, a Índia, o Brasil, a Argentina, a Venezuela. Os EUA insistem na doutrinação do mundo sob a ótica e interesse deles.

A análise também nos faz compreender melhor por que razão a mídia brasileira, cooptada, agora logo endossou o espírito do Wall Street Journal e do Heritage Foundation, criticando a 101ª posição do Brasil no ranking norte-americano...

Agora, da mesma maneira, como mostrou o jornalista Azenha, os EUA e seus aliados ricos e industrializados, com a forte ajuda da nossa mídia, continuam a tentar nos impingir “reformas modernizantes”. É repetido no Bom Dia Brasil, na CBN, no Jornal Nacional, no Jornal da Band e em quase todos os outros que, como condição prévia para que alcancemos o tal de “investment grade”, é necessário o Brasil “avançar nas reformas”. Aquelas mesmas que foram marteladas nas nossas cabeças na década de 90...

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